O encarecimento dos materiais de construção e a crise econômica agravada pela pandemia tornaram-se problemas para o mercado da construção civil. É em momentos como esse que o uso da tecnologia disruptiva pode quebrar a barreira da dificuldade e transformar o negócio.
Desde o ano passado, o grande tormento das construtoras tem sido o aumento no preço dos materiais de construção. Mesmo após a disparada no primeiro ano da pandemia, o Índice Nacional de Custos da Construção (INCC) continua em alta – o índice subiu de 11,57% nos últimos 12 meses, segundo a Fundação Getulio Vargas. Só o preço do cimento já aumentou 16,87% nos seis primeiros meses do ano.
Como de praxe, qualquer aumento impacta diretamente no preço dos imóveis. Algumas fornecedoras também deixaram de trabalhar com vendas antecipadas às construtoras, o que trava os preços negociados.
Segundo análise do OrçaFascio, software líder de mercado com foco em orçamentos de obras, os insumos e o material têm sido grandes vilões. “Se pegarmos uma obra de unidade básica do início do ano passado para o início deste ano, o custo só em material aumentou em 19%, acima da inflação, que subiu 11%”, explica Edson Poyer, CMO da empresa.
O diretor de marketing relembra que a construção civil normalmente é o primeiro setor a ser impactado e o último a sair de uma crise. “Entretanto, há muitas nuances nesse percurso do início até o fim de uma crise. Existe um impacto na venda e um impacto na produção, e isso tem uma correlação de tempo”.
O exemplo vem das gigantes
Mas como as empresas poderiam usar a tecnologia na construção civil para reduzir os custos?
É um desafio, pois várias pesquisas apontam que essa é uma das indústrias menos afeitas à inovação. “O uso de tecnologia na construção civil é sempre difícil de ter adesão”, avalia Edson.
Apesar disso, a visão das construtoras e das empresas de softwares melhorou muito de 2017 para cá. Mas quem ainda fica com os melhores resultados são as gigantes.
“As empresas mais estruturadas, no processo de gestão e de obra, estão conseguindo produzir no mesmo volume. Mas também estamos vendo que aquelas menores e menos estruturadas estão saindo do mercado. Com os juros mais altos, aquela construtora que precisa de mais financiamento para levantar uma obra tem mais dificuldade, porque ela vai ter que pagar mais por aquele dinheiro no início da obra”.
Isso, conforme explica Edson, impacta no valor dos imóveis – e o poder aquisitivo da população não tem aumentado no mesmo ritmo. “A partir dos nossos clientes, temos sentido impacto nas vendas sim, mas também não é algo desesperador. Quando veio a pandemia era desesperador, porque ninguém sabia o que seria, mas agora a sensação é de que o impacto esteja sendo menor, conforme a percepção dos clientes”.
Como as tecnologias melhoram a eficiência e reduzem custos?
O primeiro impacto é na produtividade. “A gente pega o conceito de Lean Manufacturing (de reduzir desperdícios e aumentar a eficiência), que só agora a indústria da construção está começando a adotar. A simples existência de softwares adequados para trabalhar com lean já gera produtividade”, comenta Edson.
Na prática, em uma construção convencional se consome cerca de 80 horas/homem por metro quadrado. Mas quando se tem um processo de construção mais racionalizado, ou seja, com uma ferramenta de gestão que informa o que fazer, os materiais e as pessoas para cumprir aquela etapa da obra, a eficiência é multiplicada. “Isso passa para 40h/homem por m2. Mas quando vou para uma construção industrializada, com construção modular, por exemplo, o tempo vai para 20h/homem por m2”.
Outro ponto que, na avaliação de Edson, nem sempre é tão percebido na construção civil, é o desperdício. “Num empreendimento com VGV de R$ 200 milhões, o bom construtor pensa: ‘se eu perder 5% não impacta muito, pois boto em cada unidade que vou vender’. Mas o construtor ótimo presta atenção nisso e começa a ter processo mais racional, para ter o insumo certo no lugar certo, a pessoa certa no lugar certo. Ajudar na redução do desperdício é outro ponto importante da tecnologia”.
Uma boa gestão também precisa pensar em formato de Business Intelligence (BI). Um dos pontos que têm gerado mais eficiência é as construtoras avaliarem quais indicadores precisam coletar, quais precisam avaliar e que decisões tomar a partir deles. “Se, por exemplo, estimei que gastaria X tijolos e cimento numa parede, mas percebo que estou gastando mais, preciso tomar uma decisão imediata. Entender que indicador levantar e como agir em cima dele é o que tem sido mais assertivo e produtivo”.
Tecnologias disponíveis no mercado
Para começar a aumentar a produtividade e reduzir custos na construção civil, conforme o CMO da OrçaFascio, pelo menos três tecnologias podem ajudar:
Conceito BIM (Building Information Model)
A maioria das empresas que querem trabalhar de forma eficiente já aderiu ou está tentando aderir ao BIM. A metodologia passa por transferir a informação de um projeto do começo ao fim. Numa construção tradicional, no passado, você tinha um empreendimento em 2D numa planta baixa, que trazia as informações para montar um planejamento em outro software e depois passar para o ERP para entender quando teria que pagar as contas, num processo que não é integrado. O BIM faz com que a informação ande uma etapa para a outra, de forma integrada e que facilite o trabalho de todos os envolvidos.
Realidade virtual e aumentada
Um dos eixos de desperdício numa obra é o construir errado, aplicar o projeto não tão corretamente como está. Um modelo 3D, usado por quem está na obra, pode ajudar a solucionar tudo e evitar problemas. A realidade aumentada tem a capacidade de melhorar a eficiência e qualidade do que é entregue como obra. Já a realidade virtual tem participação no processo de venda. Fazer a pessoa sentir o que está comprando antes de assinar o contrato pode ser interessante e elevar as vendas. Também pode ajudar no pós-obra, com um modelo em 3D para quem for cuidar daquele imóvel após a conclusão (o síndico, por exemplo).
Drones
Podem ser utilizados em auditorias realizadas em obras, principalmente em locais de difícil acesso. Além disso, o uso dessa tecnologia tem diversos benefícios como a gestão do canteiro de obras e o ganho em velocidade na execução de análises, e evita que os colaboradores estejam em lugares de risco, como coberturas e andaimes.
Erguer uma casa em um dia, é possível?
No primeiro trimestre de 2022, houve uma redução de 40% em lançamentos de empreendimentos no segmento econômico, segundo a Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), movimento provocado pelas incertezas econômicas, aumento de custos dos materiais da construção civil, além da estagnação produtiva em canteiro.
Utilizando tecnologias com as quais já trabalhava, destinadas a outros setores da construção, a Tecverde, pioneira na produção de painéis com estruturas de madeira (wood frame) para construção de imóveis, criou o CASA 1.0, voltada ao segmento econômico.
Com isso, a empresa conseguiu não só baratear o processo, como também diminuir drasticamente o tempo de produção como um todo. Atrelado ao banheiro e cozinha modulares, é possível construir uma casa em um dia, com todos os padrões de segurança exigidos na construção civil convencional.
“As construtoras encomendam residências térreas, que saem 85% pré-fabricadas, com a parte elétrica e hidráulica. No canteiro, em aproximadamente sete horas, toda a montagem é concluída por uma equipe da empresa, liberando o imóvel para acabamentos”, afirma Stael Xavier, responsável comercial pela empresa.
Todo o processo deve ter um custo em torno de R$ 71 a R$ 76 mil para a construtora, incluindo valores de fundação, estrutura e acabamentos da habitação, com variações a depender do volume e distância do empreendimento. Com mais unidades contratadas no projeto, o custo se torna mais competitivo, por conta da escalabilidade do processo.
Stael reforça que as empresas que industrializam o processo e começam a trazer de forma mais pronta para os canteiros de obras podem focar as energias em outros tipos de gestão. “Unir o tripé fit de mercado, industrialização e custo é a chave para ter mais viabilidade nos segmentos econômicos”, avalia.
Fonte: Imobi report.